Doce vício

(Texto da 4ª Jornada do Campeonato de Escrita Criativa organizado por Pedro Chagas Freitas. Os desafios de cada jornada não podem ser divulgados. Ah, e já acabou. Se ganhei? Sim, juízo. Vá, fiquei em 15º lugar (foram 78 os participantes). Se agrupar as pontuações iguais (pessoas com pontuações iguais eram distinguidas apenas pela ordem alfabética do seu nome) fiquei em 9º lugar (em 55).)

A nossa relação precisou sempre de ser adoçada por terceiros. Depois do jantar ficávamos os dois a olhar um para o outro e eu não conseguia resistir. Tinha sempre de juntar outra variável à nossa equação. Até que, depois de meses a tentar, lá consegui. Conseguimos, aliás. Foi difícil, não vou negar… Tentativa após tentativa. Umas falhadas, outras não. Mas tinha de fazer o esforço. Tu não merecias que eu nunca te tivesse experimentado a sós. Mas parecia que cada vez sentia mais o amargo na boca. 

Até que chegou o dia. Tinha acabado de acordar. Fui à cozinha. Liguei a máquina. Tirei um epiQ do frasco de cápsulas e coloquei-o na espécie de prensa. Fui buscar a minha chávena favorita. Carreguei no botão. Começou a escorrer. O cheiro reconfortante encheu a cozinha. Mas eu cada vez ficava mais nervosa. “Será que vou conseguir?”. A chávena encheu. Olhei para o açúcar. Abanei a cabeça. “Hoje não…”. Levei o líquido escuro e aromático aos lábios. Fiz uma careta. “Mas espera…”. A cara feia foi automática, não foi pelo amargo do café. “Tu queres ver que…”. E a partir desse dia tudo mudou. 

Já não preciso de terceiros para adoçar a nossa relação. Hoje, até consigo notar as diferenças no sabor das cápsulas Delta Q. Antigamente, para mim, a única distinção era o número da intensidade escrito nas caixas, mas agora é tudo diferente. E quando tento experimentar pôr açúcar ou adoçante… Parece água com açúcar. Nem quero pensar nisso.