O Candidato a Escritor

João já estava há 2h no Netempregos quando, finalmente, vê um anúncio que lhe interessa. “Vaga para escritor júnior” para uma empresa chamada “Anónimo”. Olha para os requisitos, mas eram os do costume - “Procuro pessoa responsável, pontual (...)”. Como já estava sem ganhar nenhum há tempo demais, responde ao anúncio. Passados 5 minutos recebe um telefonema. Era o empregador anónimo a querer marcar uma entrevista para dali a 3h. João almoça, veste-se (umas calças azuis de sarja, uma camisa branca com um blazer azul e nos pés uns brogues castanhos já com falta de graxa) e lá vai. Perde-se um pouco mesmo utilizando o Google Maps, mas chega à morada certa. Toca à campainha, a porta abre-se e sobe as escadas. Percebe que deve ser uma empresa pequena, pois o prédio é residencial. Bate à porta e abre-lha um senhor já nos seus 70 anos de pijama e robe vestidos.

- Entre, sente-se.

Sentam-se cada um numa poltrona de pele, já fora de moda, que chia cada vez que um centímetro de corpo se mexe. Há um perfume de naftalina no ar.

- Então é assim, o que eu pretendo é que o senhor João escreva a minha biografia.

- E de que tipo de histórias estamos a falar?

- Bem, eu era um moço danado, se é que me entende. - o velho pisca o olho a João - Queria que escrevesse sobre as minhas aventuras amorosas.

- Pode-me contar uma, só como exemplo? - João quer saber o que o espera.

- Bem, certo dia coloquei um anúncio no jornal…

- Estou a ver que faz isso há muito tempo – repara João

- Pois, pois. Bem, uma pessoa lá respondeu e eu telefonei-a para marcarmos uma entrevista. Ficou combinado para dali a 3h. A pessoa chegou e lembro-me que tinha vestido umas calças azuis.

João olha para baixo e repara nas calças azuis que tinha vestido. Começa a ficar um pouco apreensivo e os seus olhos procuram a porta por onde entrou há 20 minutos.

- Disse que queria que a pessoa escrevesse a minha biografia. Ela pediu-me um exemplo... - o velho pousa a mão no joelho de João que se sobressalta e corre dali para fora batendo com a porta. Corre sem destino e tira dali uma lição para a vida: não responder a anúncios anónimos.