Concerto a um domingo é começar a semana a comer bambu.
Bom, parece que os Dream Theater vieram cá dia no dia 02/02/2020 comemorar o 20º aniversário do Metropolis Pt.2: Scenes from a Memory e tocar umas músicas do CD novo Distance Over Time, porque, afinal, é este último que dá o nome à tour.
Não vinham a Lisboa há 3 anos, quase o tempo que demorou a termos novamente uma data palíndromo (quando a sequência de nºs dia, mês e ano pode ser lida da direita para a esquerda, e da esquerda para a direita). A última foi há 909 anos, em 11/11/1111, e a próxima é daqui a 101 anos, 12/12/2121, mais ou menos quando os Blind Guardian voltarem a Portugal. Ok, não foi assim tanto tempo (os 3 anos de espera de Dream Theater, não os já passados 10 anos desde que os Blind Guardian vieram ao Festival Ilha do Ermal (que já não existe)), mas quis usar a palavra “palíndromo” no texto.
Por falar em palíndromo, ou melhor, em datas, e aquela história de neste ano não ser aconselhado escrever-se a data com o ano encurtado, por exemplo 14/02/20, porque mentes maldosas podem acrescentar nº s e mudar para qualquer ano (14/02/2006, 14/02/2014, 14/02/2028…). Pelos vistos, deve-se, sim, escrever 14/02/2020.
Depois de uma data ;-) de informação não relevante para esta revie...coisa, vamos continuar com o que interessa. Bom, como o concerto começava às 20h, não jantámos, mas também tínhamos comido que nem uns texugos ao almoço. Sabiam que se costuma chamar texugo-porco ao texugo quando ele está gordo e texugo-cão quando está magro? Um pouco ofensivo, na minha opinião. Por via das dúvidas, e por boa educação, é melhor dar nome aos texugos, que, neste caso, se chamam texugos euroasiáticos.
Eu dispersar? Nunca… Bom, não jantámos, mas chegados ao Campo Pequeno estava um senhor à entrada da sala (e também dentro dela) a vender pipocas. Presságio do filme dramático que estava por vir envolvendo LaBrie a desafinar que nem um texugo-cabra?
Nunca tinha visto um concerto no Campo Pequeno. A sala de espetáculos é pequena (shocking!), mas a arquitetura é bonita. Porém, não deixei de me sentir um pouco gado bovino ali no meio da praça. O chão tinha alcatifa, mas sentiam-se umas tábuas por baixo. Não me deu uma sensação de segurança. Pareciam umas placas tectónicas que poderiam, dentro de momentos, libertar toda a sua energia acumulada. O libertador? LaBrie, claro. Ele não parte vidros, ele faz chocar placas tectónicas. Para além de alcatifa, o Campo Pequeno tem também uma enfermaria. Ideal para quem leva com um touro ou, neste caso, para quem ouve o LaBrie.
Vá já chega de bater no LaBrie. Porquê a falta de fé? Porque uns dias antes do concerto tinha visto um vídeo desta Distance Over Time Tour. Senti vergonha alheia polvilhada com pena.
Perante isto, as minhas expectativas desceram até ao subterrâneo, fazendo companhia às placas tectónicas.
Antes de começar o concerto, havia música ambiente no ar e, no palco, atrás dos instrumentos, via-se na espécie de tela uma projeção de uma imagem animada que tinha a ver com o CD novo Distance Over Time: robots do género do filme I, Robot. Robots fazem-me sentir sempre desconfortável.
A banda de apoio foi muito pontual, começando a tocar às 20h em ponto. Tocaram algumas músicas do seu CD novo (que fiquei a gostar mais depois de ouvir ao vivo), a música do acidente de carro do Petrucci criança e In The Presence of Enemies – Part 1 do CD Systematic Chaos, mais conhecido pelo CD das formigas. Nesta cerca de 1h, o suporte do microfone do LaBrie era uma mão robótica a segurar uma caveira humana, “escultura” alusiva ao CD novo.
20 minutos de intervalo. Torres, para variar, juntaram-se à minha frente para me dificultar o visionamento da banda principal. E não são umas torres quaisquer, são torres que não têm noção do espaço, tais Torres de Pisa.
Tal como a banda de apoio, os Dream Theater foram pontualíssimos. Chegadas as 20h30 lá estava o hipnoterapeuta a fazer-nos regressar a 1999, ao Metropolis Pt.2: Scenes from a Memory. Desta vez, o suporte do microfone do LaBrie era um infinito - Spirit Carries On para sempre?
O Metropolis Pt.2 é um CD especial. É o primeiro álbum conceptual da banda e conta-nos uma história cheia de plot twists que eu só fiquei a conhecer por causa do concerto. Sim, eu não ligo, ou melhor, eu não costumo perceber as letras. Tenho um problema de não conseguir entender muito bem palavras cantadas. Isto faz-me gostar de bandas só pelo som e não tanto pelas letras.
Depois do concerto fui pesquisar as letras e, como um bom poema, tive de recorrer à sebenta Wikipedia para perceber a história. Aqui vai um resumo da ópera:
Resumo das scenas
Nicholas está numa sessão de hipnose porque deve ter alguns macaquinhos no sotão. Guiado pelo hipnoterapeuta, descobre que foi Victoria numa vida passada e que ela foi assassinada. Victoria era casada com Julian mas este tinha problemas com o álcool, com as drogas e com o jogo. Então ela acaba por se envolver com o irmão dele, Edward. Após umas investigações hipnóticas, Nicholas fica convencido que Julian matou Victoria e Edward. Mas vai-se a ver e, afinal, foi Edward que matou Victoria e Julian porque eles tinham começado a reconciliar-se. Edward forjou a cena do crime e assumiu o papel de testemunha no caso. Antes de matar Victoria, ele diz-lhe "open your eyes", o mesmo comando que o hipnoterapeuta diz a Nicholas para o fazer acordar da hipnose. Já acordado, Nicholas vai para casa feliz da vida porque o espírito dele nunca morre. Não repara é que o hipnoterapeuta seguiu-o e este surpreende-o novamente com um "open your eyes". Ouve-se um grito de Nicholas. O hipnoterapeuta era o Edward reencarnado. Matou Nicholas para fechar novamente o ciclo.
E ESTA, HEIN?!
Gostei bastante de ouvir este CD inteiro ao vivo. O LaBrie surpreendeu-me. Não me pareceu muito desafinado, mas também o som não estava espetacular. Verdade seja dita, o homem já tem 56 anos e merece o meu respeito e um ralhanço virtual por andar a fazer tours de quase 3h cada concerto. Não há voz que aguente. E nas minhas pesquisas pós-concerto, descobri que em dezembro de 1994 ele teve uma intoxicação alimentar e chamou pelo Gregório com tanta intensidade que rompeu as cordas vocais. Inteligente, foi fazer uma tour logo no mês seguinte. Resultado: só se sentiu “vocalmente normal” em 2002. Não me interessa que já não cante como antes. Sempre ouvimos o Mustaine a cantar mal e ninguém se queixa. Ao menos já ouvimos o LaBrie a cantar bem. Atenção, não trocava o Mustaine por mais ninguém em Megadeth. Podem pousar os tomates podres.
A Scene Six: Home foi um sucesso para mim e a Scene Eight: Spirit Carries On foi iluminada por caga-lumes tecnológicos.
No encore o LaBrie voltou com o seu suporte de microfone robot e tocaram mais uma música do CD novo, a At Wit’s End. Foi um pouco anticlimático. Preferia um Pull Me Under, ou até mesmo, a parte I do Metropolis.
Durante todo o concerto o teclista Jordan Rudess esteve às voltinhas com o seu teclado. Aquilo virava para todos os lados, até fiquei com motion sickness. O baterista Mike Mangini parecia um puto charila com um boné com a pala para trás (ainda não percebi porque é que os fãs choram tanto a dizer que ele não é igual ao Portnoy. Pois não, são pessoas diferentes, pasme-se…). O Petrucci lá estava com os seus solos (gosto quando eles ligam bem com a música, quando é só show off irrita-me um pouco). O baixista John Myung não se dá muito por ele, mas desconfio que seja a melhor pessoa do quinteto. Faz ele bem em se afastar da luta de egos (falo isto com zero conhecimento de causa).
E para acabar, só peço uma coisa: donos de salas de espetáculo, deixem de contratar gajos com mochilas de cerveja às costas para andar no meio da plateia em pé. Atrapalha a magia, a sinergia entre o público e o artista. Fotógrafos eu aceito, agora beerbusters não.
Qualquer semelhança com a ficção é pura coincidência.
P.S.: Se quiserem ler realmente uma review e não uma coisa: Arte Sonora - Dream Theater, Um Enorme Coração Sem Alma